quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Carminho

 (http://ritacarmo.blogspot.pt/)

Carminho, filha da fadista Teresa Siqueira, estreou-se a cantar em público, no Coliseu de Lisboa, com apenas 12 anos. Foi considerada revelação feminina de 2009 com o seu primeiro álbum “Fado”.  

Como nasceu a paixão pelo fado?

O fado esteve sempre presente na minha vida, a minha mãe é fadista há muitos anos e sempre frequentámos casas de fado, anos depois a minha mãe teve a sua própria casa, portanto foi um tipo de música constante na minha infância.

Apesar de cresceres rodeada pelo fado seguiu um caminho diferente: Marketing e publicidade...

Independentemente daquilo que ia fazendo, daquilo que ia estudando, dos objectivos que tinha, sempre cantei fado e por isso sempre pensei que fosse um hobbie e não uma profissão. Chegou a altura de seguir para a universidade e escolhi aquilo que achava que queria fazer, Marketing, só mais tarde é que se veio a verificar que ia optar pelo fado a tempo inteiro.
Depois de acabar o curso fui fazer uma viagem para tentar descobrir um pouco mais de mim, dos meus gostos, descobrir a minha verdadeira vocação. Foi ai que percebi que realmente gostava muito de cantar fado, que tinha meios e condições de fazer disso uma profissão e, então, tomei a minha decisão.

No teu blogue, soldados do cozido, falas dessa viagem. Qual o sítio que mais te marcou? Revela-nos um episódio especial.

Escolher apenas um sítio é difícil, houve vários que me marcara, a Índia, por exemplo, foi um dos sítios mais marcantes, não só pela sua cultura tão diferente da nossa, e tão estranha para nós, mas porque fiz voluntariado que me permitiu conhecer muitas pessoas criando laços muitos firmes.
Tenho imensos episódios especiais. Lembro-me de uma vez, na Índia estar a caminho do trabalho e um macaco roubar-me a comida que tinha na mão. Ainda tentei ir atrás dele, mas não consegui, os macacos são espertos.

Qual foi a área de actuação durante o voluntariado? Como é que isso te ajudou no auto-conhecimento?

Na área humanitária, trabalhei com moribundos, pessoas que estão à beira da morte. O meu trabalho consistia em tentar tornar a vida dessas pessoas mais confortável, proporcionando um pouco mais de dignidade antes de morrerem.
Ajudou-me imenso, ajudou-me a perceber os meus limites, a perceber as minhas aptidões, a descobrir várias formas de poder comunicar com as outras pessoas, através de sinais que nós temos. E, claro, ajudou-me a descobrir a mim mesma.

Quais são as tuas maiores referências como cantora?

A minha grande referência é a minha mãe. Mas durante toda a minha vida ouvi muito Beatriz da Conceição, Amália Rodrigues, Carlos do Carmo, Fernando Maurício, Camané, entre muitos outros. Tenho imensas referências.

O que é o fado para ti?

Essa é uma pergunta difícil de responder. A definição de fado é sempre diferente para cada pessoa. O fado é a forma como se sente, como se recebe ou se dá sentimentos. Na minha opinião, é um momento onde há uma troca entre o fadista e os músicos que transmitem os seus verdadeiros sentimentos, ou aqueles que querem traduzir, ao público, e que estes também têm que estar numa disposição para os receber. Por isso considero que o fado passa por uma troca de emoções e de estados de espírito. Não concordo que o fado seja tristeza, para mim o fado é profundo, encara temáticas da vida, como a tristeza, a alegria, a saudade, a espera, o amor de uma forma profunda. São todos sentimentos humanos e que o fado vai buscar aqueles que são mais profundos.

O que representa o álbum “fado”?

Representa 25 anos da minha vida. Os únicos que tenho. Representa um conjunto de fados que descobri, que me ensinaram, que me ensinou a minha mãe, e as pessoas que eu fui ouvindo. Fados que aprendi por iniciativa própria, porque gostava deles ao ouvir outras pessoas a canta-los, e que já os canto desde que aprendi a cantar. Depois outros que foram surgindo ao longo dos anos, não só que fui cantando, como os que fui ouvindo e que agora tive coragem de os interpretar. Representa também o abrir de uma porta para o futuro. Representa ir ao encontro das pessoas que admiro, a escrever e a compor, permitindo coisas novas e inéditas para o meu reportório.

Ainda é possível inovar no fado?

Não sei. (risos) É difícil definir isso, o fado tem tido vários caminhos, e aqueles que ficam são aqueles que o povo, no sentido lato, quer e permite que fiquem. É preciso esperar para ver. Conheço a história do fado na década dos 30 e a forma como isso evolui para a geração da Amália. E foi ela, a Amália, a grande mentora, que permitiu um desenvolvimento e um abrir novos caminhos ao fado, através de novos compositores. Actualmente sabemos e consideramos as alterações e opções estéticas da Amália como algo clássico, como algo que ficou e que assumimos como fado, como nosso. As alterações que estão vindo a ser feitas no tempo actual, considero que só mais tarde saberemos.

Como vê a relação entre jovens e o fado?

Lindamente! (risos) Penso que com a vinda de vários fadistas, como a Mariza, abriram-se portas que têm tido uma grande projecção, tornando o fado mais popular entre os jovens. Eu própria sinto-me lisonjeada porque vejo muitos jovens nos concertos que faço. E reparem, estou a ser entrevistada por jovens. (risos). Eu também o sou, tenho 25 anos e sou igual a todos os jovens da minha idade, não sou diferente por gostar de fado. E é este meu gosto que desperta a curiosidade nos meus amigos, que vão ao meu encontro, aos meus concertos, ao encontro de outros fadistas para descobrir o fado.

                                                                                             Publicado em Março 2010

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