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(http://ritacarmo.blogspot.pt/) |
Carminho, filha
da fadista Teresa Siqueira, estreou-se a cantar em público, no Coliseu de
Lisboa, com apenas 12 anos. Foi considerada revelação feminina de 2009 com o
seu primeiro álbum “Fado”.
Como nasceu a paixão pelo fado?
O
fado esteve sempre presente na minha vida, a minha mãe é fadista há muitos anos
e sempre frequentámos casas de fado, anos depois a minha mãe teve a sua própria
casa, portanto foi um tipo de música constante na minha infância.
Apesar de cresceres rodeada pelo fado seguiu um caminho diferente: Marketing e publicidade...
Independentemente daquilo
que ia fazendo, daquilo que ia estudando, dos objectivos que tinha, sempre
cantei fado e por isso sempre pensei que fosse um hobbie e não uma profissão.
Chegou a altura de seguir para a universidade e escolhi aquilo que achava que
queria fazer, Marketing, só mais tarde é que se veio a verificar que ia optar
pelo fado a tempo inteiro.
Depois
de acabar o curso fui fazer uma viagem para tentar descobrir um pouco mais de
mim, dos meus gostos, descobrir a minha verdadeira vocação. Foi ai que percebi
que realmente gostava muito de cantar fado, que tinha meios e condições de
fazer disso uma profissão e, então, tomei a minha decisão.
No teu blogue, soldados do cozido, falas dessa viagem. Qual o sítio que mais te marcou? Revela-nos um episódio especial.
Escolher
apenas um sítio é difícil, houve vários que me marcara, a Índia, por exemplo,
foi um dos sítios mais marcantes, não só pela sua cultura tão diferente da
nossa, e tão estranha para nós, mas porque fiz voluntariado que me permitiu
conhecer muitas pessoas criando laços muitos firmes.
Tenho
imensos episódios especiais. Lembro-me de uma vez, na Índia estar a
caminho do trabalho e um macaco roubar-me a comida que tinha na mão.
Ainda tentei ir atrás dele, mas não consegui, os macacos são espertos.
Qual foi a área de actuação durante o voluntariado? Como é que isso te ajudou no auto-conhecimento?
Na
área humanitária, trabalhei com moribundos, pessoas que estão à beira da morte.
O meu trabalho consistia em tentar tornar a vida dessas pessoas mais
confortável, proporcionando um pouco mais de dignidade antes de morrerem.
Ajudou-me
imenso, ajudou-me a perceber os meus limites, a perceber as minhas aptidões, a
descobrir várias formas de poder comunicar com as outras pessoas, através de
sinais que nós temos. E, claro, ajudou-me a descobrir a mim mesma.
Quais são as tuas maiores referências como cantora?
A
minha grande referência é a minha mãe. Mas durante toda a minha vida ouvi muito
Beatriz da Conceição, Amália Rodrigues, Carlos do Carmo, Fernando Maurício,
Camané, entre muitos outros. Tenho imensas referências.
O que é
o fado para ti?
Essa
é uma pergunta difícil de responder. A definição de fado é sempre diferente
para cada pessoa. O fado é a forma como se sente, como se recebe ou se dá
sentimentos. Na minha opinião, é um momento onde há uma troca entre o fadista e
os músicos que transmitem os seus verdadeiros sentimentos, ou aqueles que
querem traduzir, ao público, e que estes também têm que estar numa disposição
para os receber. Por isso considero que o fado passa por uma troca de emoções e
de estados de espírito. Não concordo que o fado seja tristeza, para mim o fado
é profundo, encara temáticas da vida, como a tristeza, a alegria, a saudade, a
espera, o amor de uma forma profunda. São todos sentimentos humanos e que o
fado vai buscar aqueles que são mais profundos.
O que representa o álbum “fado”?
Representa
25 anos da minha vida. Os únicos que tenho. Representa um conjunto
de fados que descobri, que me ensinaram, que me ensinou a minha mãe, e as
pessoas que eu fui ouvindo. Fados que aprendi por iniciativa própria, porque gostava
deles ao ouvir outras pessoas a canta-los, e que já os canto desde que aprendi
a cantar. Depois outros que foram surgindo ao longo dos anos, não só que fui
cantando, como os que fui ouvindo e que agora tive coragem de os interpretar. Representa
também o abrir de uma porta para o futuro. Representa ir ao encontro das
pessoas que admiro, a escrever e a compor, permitindo coisas novas e inéditas
para o meu reportório.
Ainda é possível
inovar no fado?
Não
sei. (risos) É difícil definir isso, o fado tem tido vários caminhos, e aqueles
que ficam são aqueles que o povo, no sentido lato, quer e permite que fiquem. É
preciso esperar para ver. Conheço a história do fado na década dos 30 e a forma
como isso evolui para a geração da Amália. E foi ela, a Amália, a grande
mentora, que permitiu um desenvolvimento e um abrir novos caminhos ao fado,
através de novos compositores. Actualmente sabemos e consideramos as alterações
e opções estéticas da Amália como algo clássico, como algo que ficou e que
assumimos como fado, como nosso. As alterações que estão vindo a ser feitas no
tempo actual, considero que só mais tarde saberemos.
Como vê a relação entre jovens e o fado?
Lindamente!
(risos) Penso que com a vinda de vários fadistas, como a Mariza, abriram-se
portas que têm tido uma grande projecção, tornando o fado mais popular entre os
jovens. Eu própria sinto-me lisonjeada porque vejo muitos jovens nos concertos
que faço. E reparem, estou a ser entrevistada por jovens. (risos). Eu também o
sou, tenho 25 anos e sou igual a todos os jovens da minha idade, não sou
diferente por gostar de fado. E é este meu gosto que desperta a curiosidade nos
meus amigos, que vão ao meu encontro, aos meus concertos, ao encontro de outros
fadistas para descobrir o fado.
Publicado em Março 2010